Arquivo da categoria ‘Vinicius de Moraes’
Quando a luz dos olhos meus 2 comments
Quando a luz dos olhos meus
Sentir-me apenas homem e não poeta! 2 comments
“Ó, quem me dera não sonhar mais nunca
Nada ter de tristezas nem saudades
Ser apenas Moraes sem ser Vinicius!
Ah, pudesse eu jamais, me levantando
Espiar a janela sem paisagem
O céu sem tempo e o tempo sem memória!
Que hei de fazer de mim que sofro tudo
Anjo e demônio, angústias e alegrias
Que peco contra mim e contra Deus!
Às vezes me parece que me olhando
Ele dirá, do seu celeste abrigo:
Fui cruel por demais com esse menino…
No entanto, que outro olhar de piedade
Curará neste mundo as minhas chagas?
Sou fraco e forte, venço a vida: breve
Perco tudo; breve, não posso mais…
Oh, natureza humana, que desgraça!
Se soubesses que força, que loucura
São todos os teus gestos de pureza
Contra uma carne tão alucinada!
Se soubesses o impulso que te impele
Nestas quatro paredes de minha alma
Nem sei o que seria deste pobre
Que te arrasta sem dar um só gemido!
É muito triste se sofrer tão moço
Sabendo que não há nenhum remédio
E se tendo que ver a cada instante
Que é assim mesmo, que mais tarde passa
Que sorrir é questão de paciência
E que a aventura é que governa a vida
Ó ideal misérrimo, te quero:
Sentir-me apenas homem e não poeta!”
Vinicius de Moraes (Elegia quase uma ode)
Soneto à lua – Vinicius de Moraes Leave a comment
Por que tens, por que tens olhos escuros
E mãos lânguidas, loucas e sem fim
Quem és, quem és tu, não eu, e estás em mim
Impuro, como o bem que está nos puros?
Que paixão fez-te os lábios tão maduros
Num rosto como o teu criança assim
Quem te criou tão boa para o ruim
E tão fatal para os meus versos duros?
Fugaz, com que direito tens-me presa
A alma que por ti soluça nua
E não és Tatiana e nem Teresa: E és tampouco a mulher que anda na rua
Vagabunda, patética, indefesa
Ó minha branca e pequenina lua!
Vinicius de Moraes (Rio de Janeiro, 1938)
Soneto do corifeu Leave a comment
“São demais os perigos desta vida
Para quem tem paixão, principalmente
Quando uma lua surge de repente
E se deixa no céu, como esquecida.
E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher.
Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer, de tão perfeita.
Uma mulher que é como a própria Lua:
Tão linda que só espalha sofrimento
Tão cheia de pudor que vive nua.”
Vinicius de Moraes
Poema dos olhos da amada – Vinicius de Moraes Leave a comment
Ó minha amada
Que olhos os teus!
São cais noturnos
Cheios de adeus.
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe,
Longe nos breus…
Ó minha amada
Que olhos os teus!
Quanto mistério
Nos olhos teus.
Quantos saveiros,
Quantos navios,
Quantos naufrágios,
Nos olhos teus…
Ó minha amada
Que olhos os teus!
Se Deus houvera
Fizera-os Deus.
Pois não os fizera
Quem não soubera
Que há muitas eras
Nos olhos teus.
Ah, minha amada
De olhos ateus.
Cria a esperança
Nos olhos meus,
De verem um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus.
Vinicius de Moraes (Rio de Janeiro 1950)
FELIZ NATAL!!! Leave a comment
Para isso fomos feitos: Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte
De repente nunca mais esperaremos…
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Vinicius de Moraes
O Blog “Livros com Pipoca” deseja a todas que fazem parte dessa família um Feliz Natal e um 2015 repleto de alegrias e esperanças!!!! E muito obrigado a todos por estarem conosco nesse ano, sem vocês isso não vale a pena!
Vinicius de Moraes – Procura-se uma rosa 2 comments
Silêncio, silêncio
Que melancolia
Perdeu-se uma rosa
De dia, de dia.
Tristeza, tristeza
Que vida vazia
Perdeu-se uma rosa
Quem a encontraria?
Como era formosa
Que pele macia
Perdeu-se uma rosa
Morreu a poesia.
Ó rosa da aurora
Ó rosa do dia
Só a noite escura
Te receberia.
Se virem a rosa
Na sua agonia
Ó digam à bela
À rosa macia
Que a vida sem ela
Não tem alegria.
Vinicius de Moraes – Trecho de “Procura-se uma rosa”